Não são togas, ternos e gravatas que fazem o homem e seu caráter; são os homens, com seus valores e atitudes, que dignificam (ou avilanam) as suas respectivas indumentárias.
Assim são as instituições. Essas são expressões não tanto de conceitos gélidos e findos, que podem simplesmente jazer na letra da lei (apesar do brilho de suas formulações); mas são construções inacabadas do dia-a-dia, esculpidas, ininterruptamente, pelos traços do desempenho de seus ocupantes – que podem afirmá-las e ilustrá-las pelo bom exemplo, ou pervertê-las e esvaziá-las de sentido, pela perfídia de suas performances.
As instituições sem os indivíduos não passam de mera abstração, de intangível metáfora, pura metafísica. Pois elas só existem e se realizam, na dimensão da história, na objetividade da concretude, na materialidade da empiria – e não na ideia, na conjectura ou na imaginação. E por mais que não se reduzam a seus passageiros inquilinos – pois cumprem (deveriam cumprir) funções de natureza impessoal e coletiva –, por esses podem ser empobrecidas e desacreditadas, quando marcadas pela disfunção de suas respectivas atuações.
Decerto, não são apenas as instituições que moldam, enquanto “estruturas”, o comportamento dos indivíduos. Os homens, à sua vez, também engendram e plasmam, por meio de suas ações, a substância das instituições – dimensões múltiplas e combinadas de um mesmo e único processo, mutuamente constitutivo. Tal é, em realidade, a “dialética do concreto”, em sua pulsante e contraditória manifestação social e histórica.
As instituições, assim, não se confundem com os indivíduos; mas os pressupõem – sem os quais não existem. Dependem, por conseguinte, de suas atitudes, de suas performances, do conteúdo (benigno ou nocivo) de seus desempenhos – do que decorre a sua legitimação e renovação no tempo, ou o seu questionamento e desapreço por parte da sociedade.
As instituições são, por suposto, o dever-ser societário idealizado, projetado em suas funções e finalidades. Os indivíduos que temporariamente as integram são apenas os artífices da realização dessas funções, enquanto efetivação (assim se espera) do bem coletivo. Quando cumprem corretamente o seu papel, os sujeitos engrandecem e valorizam as estruturas em seus desígnios; quando não, agridem-nas e deslegitimam-nas perante a coletividade que as mantém, colocando em risco a sua prevista longevidade.
O que se tem visto ultimamente no Brasil é, justo, a burla dessa lógica; a inversão manipulada desse entendimento, à medida que os ocupantes dos cargos pretendem ser, eles próprios, as instituições tout court – reduzindo-as a si, ao estilo Luís XIV (“l’État c’est moi”) –, ao invés de subordinarem-se, comme il faut, aos protocolos e liturgias de suas funções, honrando-os com seus comportamentos e postura.
Nessa subversão de sentido, os ataques às “excelentíssimas” autoridades passaram a ser tratados, por elas mesmas, como “assédios” às próprias instituições, imputando-se, sordidamente, aos “contestadores da ordem” o falso selo de “agressores da democracia”, quando ocorre, na verdade, exatamente o inverso.
Nenhum ególatra ou tiranete de ocasião tem o direito de reduzir, por hipócrita vileza, uma instituição pública a si mesmo, como se fosse o seu dono e a sua medida. Quando as ações de integrantes das instituições não são condizentes com os desígnios para os quais elas foram criadas, esses devem ser, sim, nelas contestados e delas expurgados, em vista de salvá-las de seus nocivos propósitos – e não o contrário, deixando-as à mercê de seus corruptores. Pois são os indivíduos que têm de estar à altura das instituições à qual pertencem – das funções para as quais foram designados – e não vice-versa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
SUA POSTAGEM SERÁ PUBLICADA DEPOIS DE SER MODERADA. OBRIGADO!
Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.